2007 - 2017: 10 anos para nada?

Pax et bonum!
Salve Maria!

Segue abaixo uma tradução nossa de uma das cartas do recomendado Paix Liturgique. Esta carta saiu em francês sob o número 576, publicada no dia 03/01 deste ano.
Nela há dados interessantes sobre a aplicação do Summorum Pontificum na França e o cansaço que certas situações têm causado nos fiéis, o que nos parece não ser algo exclusivo do país de Santa Teresinha do Menino Jesus.
O título fala por si só e leva a uma necessária reflexão: enfim, o que se ganhou nestes 10 anos?
Nossa tradução livre e não oficial está sendo publicada aqui com permissão de Paix Liturgique concedida no dia 22/01 por email.


***

O ano de 2017 marcará o décimo aniversário do motu proprio Summorum Pontificum de 7 de julho de 2007. O texto de Bento XVI, que entrou em vigor no dia 14 de setembro seguinte, dizia que o missal tradicional nunca foi abrogado e instaurava, ao menos teoricamente, um regime de liberdade quanto à celebração da antiga liturgia.
Teoricamente...
Com efeito, e sem negar a importância e o alcance do texto, que consideravelmente fez mudar os rumos e as mentalidades - e pelo que não cessamos de render graças -, é preciso constatar que na prática ele ainda não pôde atender às expectativas dos fiéis.
O objetivo da presente carta não é fazer um balanço do motu proprio, mas de tentar compreender por que, dez anos depois de Summorum Pontificum (SP), a situação francesa (N.T. e por que não dizer brasileira também e, quiçá, mundial?) parece relativamente congelada e não progride a não ser muito timidamente?

I - Uma triste constatação

"Não temos registros atuais; não há mais pedidos de missas relativas ao motu proprio com problemas nas dioceses francesas", pode-se ouvir hoje em dia nos escritórios da comissão Ecclesia Dei em Roma. Factualmente, isso está perfeitamente exato.
Contudo, isto quer dizer que não há mais problema litúrgico na França? Que tudo vai bem numa Igreja ansiosa por responder às aspirações litúrgicas de todos os seus fiéis? Não, na verdade os fiéis que pedem simplesmente acabaram por cansar-se.
Os meses que se seguiram à entrada em vigor do motu proprio de 2007 viram numerosas esperanças se manifestarem e múltiplos grupos de fiéis se dirigirem filialmente aos seus pastores para se beneficiar do tesouro que lhes oferecia teoricamente o texto pontifício. Certamente, excelentes resultados foram obtidos. Algumas paróquias abriram-se honestamente à liturgia tradicional (e continuam a fazê-lo até hoje). Outras, porém, fizeram-no traindo o espírito e a letra do motu proprio. Mas a grande maioria, ai!, permanece surda aos pedidos formulados pelas famílias. De tal modo que, no correr dos meses e anos, novos pedidos paroquiais tornaram-se mais e mais raros.
Esta falta de expressão de novos pedidos explica-se pela resignação dos fiéis, que compreenderam que a maioria dos bispos e dos padres não desejaria a paz litúrgica e faria tudo para privar de seu efeito o motu proprio de Bento XVI.
Má fé, manipulações grosseiras, calúnias e mentiras, nenhuma arma foi negligenciada por aqueles que deveriam ser os artesãos da unidade litúrgica (cf. SP Art. 5-§ 1).
Segundo os casos, respondem aos fiéis que pedem: "Vocês não são da paróquia" ou "Já existe uma celebração na diocese e o bispo julga que não é necessário criar outra" ou ainda "Falaremos com o conselho paroquial que estudará o pedido de vocês, daremos um retorno em seis meses". Utiliza-se também o argumento do número. Às vezes os fiéis não eram tão numerosos, enquanto noutros lugares, como em Vaucresson na diocese de Nanterre, eram muitos e foram acusados de pôr em perigo o equilíbrio paroquial.
Um sacerdote benevolente, mas em fim de mandato, explicava aos fiéis que pediam, que era melhor "aguardar a chegada do [seu] sucessor", enquanto o que chegava pedia a eles que "deixassem o tempo para ele se instalar", etc, etc.
Resumindo, o essencial das reações eclesiásticas, sob o cajado das autoridades episcopais, foi organizar o freio e a recusa, manter o apartheid litúrgico e desanimar os mais decididos fiéis. Naturalmente, e nossas cartas fornecem provas abundantes (certos leitores criticam-nos dizendo que somos muito otimistas!), existem belas exceções diocesanas e paroquiais. Mas, no passar de uma década, elas constituem sempre exceções a uma regra que permanece sendo a negação.
O povo fiel tem consciência. Já faz um bom tempo que ele compreendeu que a vontade de "chegar às periferias" ou de "acolher a diferença" não passava de um encantamento usado na mídia e que não era linha de conduta para uso intra-eclesial.

II - No entanto...

Nem tudo é negativo no negativo. O motu proprio de 2007 tem pelo menos o mérito de permitir ao motu proprio de 1988 (Ecclesia Dei) começar a ser melhor e mais aplicado. Com efeito, enquanto o artesão do Summorum Pontificum é teoricamente o padre da paróquia, o tratamento dos pedidos tem sido, na prática e contrariando o espírito e a letra do motu proprio de 2007, quase sempre decidido no nível episcopal, como mandava o Ecclesia Dei há uns quase 30 anos atrás. Isto provavelmente é o que os bispos chamam de "viver com o seu tempo"...
Resta que, se os bispos desejassem realmente a paz litúrgica, eles teriam há muito tempo feito com que de alguma forma os fiéis tivesse concretamente acesso a esta forma de celebração pelo menos nas catedrais e nas igrejas mais centrais, num primeiro momento. Eles teriam feito da liturgia tradicional um tesouro acessível a qualquer católico que o quisesse e não mais uma peça de museu reservada aos fiéis que escolheram deixar suas paróquias por lugares de culto próximos a reservas indígenas.
Neste ano do décimo aniversário do motu proprio Summorum Pontificum queremos recordar que segundo as múltiplas sondagens realizadas por organismos profissionais e independentes entre 2008 e 2011, pelo menos 1 a cada 3 católicos franceses praticantes participaria ao menos uma vez por mês da celebração da forma extraordinária do rito romano se fosse proposta em sua paróquia.
Estas estatísticas, verificadas no tempo, no espaço e em diferentes institutos de sondagem solicitados, jamais foram levadas em conta, nem mesmo debatidas pela hierarquia católica. 
A omertà (N.T. termo napolitano que designa o voto de silêncio dos membros da máfia) organizada sobre os estudos científicos e a recusa de toda discussão sobre os dados estatísticos falam muito sobre os preconceitos litúrgicos que continuam a reinar na França. E se as pesquisas de opinião assustam os bispos - que anseiam por elas quando se trata de assuntos políticos -, por que não considerar a realidade das missas dominicais?
Por toda parte em que a experiência Summorum Pontificum tem sido tentada honestamente, a um ritmo dominical/semanal e num horário familiar, por um padre benevolente, ela tem sido um sucesso e em nada esvaziou o lugar de culto vizinho. Não mais que os bancos das capelas da Fraternidade São Pio X.
Neste início de 2017, fazemos um voto para que a nova geração de sacerdotes que se levanta, que não tem as olheiras ideológicas dos mais velhos, aplique honestamente e com liberdade de espírito o motu proprio de Bento XVI, sob o cuidado de bispos finalmente prontos para dar prova de realismo, se não de benevolência, pastoral. É tempo de aceitar a realidade tal qual é, a saber: que em cada paróquia francesa, uma parte consistente de fiéis participaria de boa vontade na forma extraordinária do rito romano se a ocasião lhe fosse oferecida pelo pároco.
O resto não passa de langue de buis (N.T. entendo que seja o mesmo que "langue de bois", expressão que designa conversa fiada, politicamente correta, confusa ou dúbia para distorcer uma realidade; palavrório).

Traduzido por Luís Augusto - membro da ARS

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