Os passos da reforma litúrgica pós-conciliar - O Card. Bacci e "A túnica rasgada" de Tito Casini

Pax et bonum!

Prosseguimos no início de 1967. Iríamos começar hoje a tradução da Alocução de Paulo VI ao Consilium, de 19/04/1967 quando, no mesmo texto francês, encontramos uma nota explicando que o Papa, defendendo o Card. Lercaro, em certo ponto, citou uma publicação que seria o livro "La tunica stracciata" (ou seja, "A túnica rasgada"), de Tito Casini (1897-1987), escritor italiano que produziu interessantes textos sobre as consequências más das mudanças que aconteciam após o Concílio.
Pois bem, enquanto Paulo VI defendia o Card. Lercaro, o livro em questão tinha seu prefácio escrito pelo Card. Antonio Bacci.
Achamos por bem traduzir o prefácio da obra, que estará citada na alocução que virá nas próximas postagens. O prefácio por si nos revela que a situação das arbitrariedades no campo litúrgico parece agravar-se. Se no ano anterior (1966) se falava das "ceias eucarísticas", vemos agora outras "missas", como a "missa beat".
"La tunica stracciata" e outros escritos de Tito Casini estão disponíveis neste site:

Cidade do Vaticano, 23 de fevereiro de 1967

Fui convidado a fazer uma breve apresentação deste pequeno volume de Tito Casini. Não posso e nem quero recusá-lo, antes eu o faço de boa vontade, embora com algumas reservas, seja porque conheço Tito Casini desde a infância e o considero como um dos maiores escritores católicos da Itália por seu estilo fresco, cáustico e sincero, que me recorda o ar puro e montanhês da sua e minha Firenzuola, seja porque ele é um cristão íntegro e pode repetir aquilo que dizia de si um antigo escritor sacro: "Christianus mihi nomen, catholicus cognomen"; seja enfim porque se este seu escrito pode parecer pouco reverente para alguns, todos porém devem reconhecer que foi feito tão somente por um ardente amor pela Igreja e seu decoro litúrgico.
Todavia, pode-se e deve-se afirmar que nada quanto ele escreve neste pequeno volume é jamais contra aquilo que o Concílio Vaticano II estabeleceu na sua Constituição Litúrgica, mas sim contra a aplicação prática que da dita Constituição Litúrgica quiseram fazer a qualquer custo alguns inovadores impacientes e exagerados. E não falemos daquilo que, neste chão escorregadio, alguns estão fazendo com as assim chamadas "ceias eucarísticas", "missa beat", "missa iê-iê", "missa dos hippies", e "semelhantes imundícies".
Faço-o de boa vontade, já o disse, porque penso que estas páginas, que recordam aquelas ainda mais inflamadas, ardentes e sem escrúpulos de Santa Catarina de Sena, podem endireitar certas ideias e fazer bem.
Confio portanto que os interessados perdoarão generosamente o autor por certas frases que podem lhes parecer pouco respeitosas, refletindo que essas foram escritas não para ofender, mas somente porque o coração estava exacerbado por certas inovações, que parecem e são verdadeiras profanações.
De resto, há sempre o que aprender de todos; também da voz daqueles leigos, especialmente daqueles leigos que são, como Tito Casini, perfeitos católicos.
E aqui não posso deixar de recordar que foi constituída uma Federação Internacional para a salvaguarda do latim e do canto gregoriano na liturgia católica, Federação que conta com inúmeras pessoas de toda classe de onze nações, e que tem sede na Suíça, em Zurique. Ela publica uma revista que com frase latina se intitula "Una Voce", frase que para nós pode também ser italiana, porque a nossa língua nacional, como se disse, é quase um dialeto latino; e o latim da liturgia, herdeiro do "sermo rusticus" falado pelo povo, pode ser compreendido facilmente, pelo menos em grande parte, melhor que certas traduções bárbaras, nas quais traduzir é o mesmo que trair.
No número de janeiro deste ano, a dita revista afirma que "sente o dever de denunciar certas situações de fato, que absolutamente não correspondem à renovação desejada pelo Concílio". A dita Constituição Conciliar (art. 36, 1) estabeleceu como princípio geral a conservação do latim nos ritos sagrados, concedendo porém que se possa usar nas leituras e em determinadas partes da Missa o vernáculo, se isto for útil para uma maior compreensão por parte do povo. Mas o uso total e exclusivo do vernáculo, como se faz em muitas partes da Itália, não só é contra o Concílio, como causa também um intenso sofrimento espiritual para grande parte do povo.
Penso então que a súplica enviada à Conferência Episcopal, pela sessão italiana da dita Associação Internacional pela salvaguarda da língua latina e da música sacra na liturgia católica, merece ser levada em atenta e favorável consideração, a fim de que não aconteça que, enquanto se celebra a Missa em um péssimo italiano, e os outros ritos sagrados em língua vernácula, e até em esperanto, o Latim - língua oficial da Igreja - seja, pois, banido totalmente dos ritos sagrados como um cão leproso.
Por isso, parece oportuno que, ao menos nas Igrejas Catedrais, nos Santuários, nos centros turísticos e onde quer que haja clero suficiente, celebrem-se ao menos algumas missas em latim, em horários definidos, para responder ao justo desejo daqueles - estrangeiros e italianos - que preferem o latim ao vernáculo e o canto gregoriano a certas cançõezinhas vulgarzinhas que hoje tentam substituí-lo, certamente com pouco decoro do culto católico.

+ Antonio Cardeal BACCI

Tradução por Luís Augusto - membro da ARS

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